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  • Foto do escritormelody erlea

i'm not ok with this, uma série cheia de adolescentes legais e figurinos que contam histórias


quando eu era adolescente tinha toda uma comunidade teen apegada a ídolos do passado, bandas obscuras e mídias obsoletas (naquela época era vinil, cd ainda era a coisa do momento e k7 não tinha muito apelo, provavelmente porque a gente tinha memórias palpáveis de uma infância recente em que os aparelhos de som de fita k7 causavam mais stress com cabeçote sujo e fitas desenroladas sem volta do que alegria por estar ouvindo música - já as memórias com toca-discos eram mais romantizadas, até por ser uma mídia com muito mais história do que a fita) (inaugurando o estilo abrir-um-parênteses-logo-após-o-outro, devo dizer que na juventude eu dirigia um carro que havia sido do meu avô e tinha toca-fitas e era o maior barato, ressuscitei todas as mixtapes do meu pai e até ganhei uma fitinha-playlist de uma amiga).


esses adolescentes e jovens escutadores de vinil demoravam pra se encontrar por são paulo na época pré-internet (e até no comecinho dela) então esse grupos se apegavam como pequenos cultos, onde a única regra era curtir música da hora.


é uma loucura perceber que parte desses adolescentes é, como eu, adulto, e eles tão por aí, criando histórias sobre adolescentes como nós, meio esquisitos mas cheios de estilo, ou seja, basicamente criando histórias sobre todos nós, ao mesmo tempo que falam sobre uma geração de adolescentes posterior à nossa.


i'm not ok with this é uma dessas histórias, cheia de adolescentes divertidos, estranhos, imperfeitos e com com um gosto especial por vinis e músicas de artistas que muito provavelmente transformaram todos nós em queers peculiares e indies amargurados.


o maior exemplo disso na série é stanley barber, o adolescente hipster fashionista, que ouve punk e loucuras popdos anos 80 e mora no porão da casa dos pais que é maior e mais bem decorado que meu apartamento e tem uma coleção de vinis que eu preciso trabalhar um ano pra conseguir comprar MAS a gente releva essa inverossimilhanças e finge que essa é a vida de um adolescente no bairro pobre da cidade pobre do interior dos estados unidos.


e a gente esquece mesmo, porque stanley é legal e, cara, como ele se diverte se vestindo!

sem contar que ele repete roupa na cara dura, porque lookão mesmo tem mais é que ser repetido e quem tem um acervo incrível de roupas quer mais é que elas sejam lembradas e associadas a quem tá vestindo. signature look, chama.

tava esses dias mesmo conversando com um dos pouquíssimos seguidores homens hétero que acompanham meu blog - e dos caras hétero, é o único que interage, comenta, conversa comigo por mensagem - sobre essa ideia recorrente de que mulher tem mais opção pra ser criativa com roupa, que o guarda-roupa masculino é mais restrito e por isso os caras variam menos. stanley barber taí pra provar que isso é balela: o guarda-roupa masculino é tão versátil, divertido, colorido e original quanto o feminino.


são os homens que são criados pra acreditar que esse tipo de olhar e criatividade pertence às mulheres apenas. desde a revolução francesa e a ascenção da burguesia, a gente aprende que roupa: coisa de mulher; cores: coisa de mulher; vaidade: coisa de mulher; gostar de montar looks: coisa de mulher. há uma insegurança, um medo, uma resistência a sair do vestuário padrão masculino porque isso significa, também, abrir mão de parte da masculinidade (que, a gente já sabe, se baseia em valores e premissas tão frágeis e inventadas quando a feminilidade).


e por que os caras não ficam confortáveis quando sentem que um pouquinho que seja de sua masculinidade tá diminuindo? porque masculinidade, na nossa sociedade, é poder. abrir mão dela é abrir mão de um pouco de poder, que convenhamos, pra muitos caras nem é muito. pra alguns, é todo poder que eles tem.


mas o stanley tem um porão da hora (embora tenha um pai nada da hora e bem representativo do tipo mais claro de masculinidade, do tipo de homem que chama o próprio filho de viado só porque ele tá com uma roupa estilosa), e sua familiaridade com músicos, muitas vezes tão fora de lugar quanto ele, lhe dá a segurança pra ser quem ele é.




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