melody erlea
issey miyake e o uniforme de steve jobs

se liga nessa história: depois da segunda guerra a vida no japão tava meio difícil (não só no japão mas vamos manter o foco). as coisas voltavam lentamente a melhorar e grandes empresas japonesas tipo a sony (fundada em 1946, ou seja, logo depois do caos todo), precisavam ajudar seus funcionários a irem ao trabalho todo dia.
um dos grandes problemas pra classe operária era falta de oferta de roupas - especialmente pra usar todo dia no trampo. então muitas empresas forneciam uniformes aos seus funcionários. no começo uniformes neutros e meio genéricos, com o tempo cada empresa os aperfeiçoou, os tornou símbolo de uma cultura coorporativa entre os trabalhadores e também maneira de criar vínculo entre todas aquelas pessoas dentro do mesmo ambiente.
a sony, especialmente, foi a fundo nessa ideia: a partir dos anos 70 quem desenhava os uniformes da empresa era o estilista issey miyake, que começou sua carreira nos anos 60 e se tornou um dos maiores nomes da moda japonesa, ao lado de yohji yamamoto e comme des garçons. essa foto aí, desse casaco bem com carinha de fábrica, é uma peça original dos anos 70 de miyake para a sony.
e por que isso é legal? adivinha quem visitou a sony nos anos 80 e ficou interessadíssimo pela estética do uniforme? ele mesmo, o patrão das porrinha eletrônica da moda, steve jobs. ele perguntou qualéqueé? pra akio morita, o presidente da empresa, e morita explicou toda essa história que eu acabei de contar.

que que pequeno steve fez quando voltou pra sua terra natal apple? numa palestra pros funcionários sugeriu a implementação do mesmo uniforme - um casaco de nylon que vira colete com mangas que saem. a reação dos funcionários da apple? todos riram muito de seu chefe e jobs abandonou a ideia de obrigar todo mundo a usar a mesma roupa todo dia.
mas a gente bem sabe que ele decidiu ele próprio usar a mesma roupa todo dia, e o uniforme da sony tem tudo a ver com essa decisão, sabia?
li num artigo que ao optar por usar a mesma roupa todo dia, steve jobs permitiu que a imagem da apple fosse maior que a sua própria. não sei se concordo.
o uniforme de steve jobs já foi tão comentado e analisado quanto cada um dos novos lançamentos de porrinha eletrônica da apple. é inegável que sua estética se tornou inconfundível, uma assinatura, algo que a gente reconhece imediatamente - todo mundo a partir de agora que usar jeans e gola alta preta vai ser associado ao steve jobs, não tem jeito.
e é muito louco isso: uma escolha feita pra, justamente, ajudá-lo a evitar escolhas desnecessárias, um visu escolhido pra ser discreto, simples, sem informação extra - acaba virando por si só um ícone, uma representação imagética de todo um imaginário da persona steve jobs. um look básico que virou um símbolo pop. acho que é isso que a @isabelclara_ chamaria de marca pessoal forte e de sucesso, néam?
não é qualquer um que pode sair por aí com a mesma roupa todo dia - ainda mais uma roupa sem muita informação de moda. essa liberdade sartorialista implica uma credibilidade em projetos sólidos, feitos que tenham virado referência na área, alguém que tem resultados tão impressionantes que pode se dar o direito de não pensar em sua aparência.
e entendam: não é que ele realmente não tá pensando na aparência. ele tá pensando tanto que teve que tomar uma decisão que o ajudasse a pensar menos. essa escolha é intencional, planejada pra passar uma mensagem de praticidade, conforto e roupa como não-prioridade. e pode até ser prático e confortável, mas o fato de que jobs teve que ativamente escolher essa estética mostra quão prioritária é roupa.
tão prioritária que não é qualquer gola-alta que ele usava não: era especificamente a gola alta do estilista issey miyake, que jobs conheceu ao contactá-lo pra criar um uniforme pros funcionários da apple. a ideia não pegou na empresa, mas moveu profundamente steve jobs - que encomendou umas 100 blusas pretas pra miyake e nunca mais vestiu outra coisa.
escolha de moda, que chama, e até quando a gente acha que não tá fazendo uma, a gente tá sim. que pelo menos seja intencional, né? isso é o que aprendi com steve jobs.