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notas sobre moda: camp, susan sontag e o baile do met



patrocinado pela revista vogue e com uma história que começa em 1948, o met gala é uma festa chique anual do metropolitan museum, em nova york. é um evento para angariar fundos para conservar o costume institute, o instituto de moda do museu. os convidados celebridades costumam se esforçar ao máximo para pensar nos trajes da noite, que a cada ano tem um tema diferente.


os temas variam muito e são altamente subjetivos - as roupas são a interpretação particular de cada convidado e seu personal stylist (porque pra esse tipo de festa sempre é necessário um auxílio, um olhar expert atencioso, porque, gemt, é muita montação pra pensar sozinho). ano passado o tema foi corpos celestiais, em 2013, um dos meus anos favoritos, o tema foi punk, já teve muita homenagem a estilista, movimento artístico, livro, período histórico.... basicamente todo tema possível pra festa a fantasia já foi tema do baile do met.


o baile desse ano, que aconteceu na segunda, teve um tema inspirado na primeira publicação da escritora e ativista susan sontag, "notes on camp", de 1964. sontag é mais conhecida pelos seus ensaios sobre fotografia de 1973, mas foi notes on camp que catapultou sua popularidade entre os intelectuais e o fervo de nova york - é um ensaio sobre estilo de vida e sobre gosto pessoal, em que ela esmiúça o tal do "camp", que é um fenômeno estético principalmente homossexual (pelo menos lá nos anos 60, atualmente me parece que o instagram inteiro é camp): aquela atração pelo exagerado, pelo artifício, pelo espetáculo, pelo flamboyant..... pelo que podia ser quase feio mas não é, ou é tão ruim que é bom.


o camp combina uma vibe kitsch, de exageros quase cafonas, com o refinamento afetado aristrocático: uma atenção à imagem pessoal e de ambientes que demonstre conhecimento cultural mas desapego com normas da alta sociedade culta sobre o que é considerado de bom ou mau gosto. sontag menciona alguns ícones do camp, que vão de personalidades, como oscar wilde e greta garbo, a objetos e obras de arte, como abajures da tifanny's, quadrinhos do flash gordon e roupas dos anos 20.


a ideia geral do texto é de que camp é uma brincadeira com o se montar que demonstra referência cultural mas retira a seriedade e a sobriedade dessas referências. me parece bem apropriado pra um baile de moda - um universo baseado no se montar em referências mas tirar delas todo significado original para que virem show, espetáculo, explosão estética. se a gente for pensar bem mesmo, esse nem precisava ser o tema porque esse já é o tema sempre, lá no fundo. um encontro anual de pessoas que ganham a vida fazendo espetáculo de si mesmas.


uma questão que susan pontua em seu ensaio é que o verdadeiro camp é aquele que não está tentando ser camp - ele é espontâneo e ingênuo. quando o camp é forçado - caso do baile do met - ele é menos satisfatório, por ser menos honesto. mas a moda é isso mesmo: ela pega movimentos estéticos naturais de grupos sociais e os transforma em fantasia de celebridade, se alimentando de toda borbulhação cultural que nasce nas ruas desse mundão doido.


o título do texto é "notes on camp", mas o tema do baile era camp: notes on fashion, o que me parece uma maneira honesta de ressignificar o camp pra ele funcionar no contexto desse evento: não é sobre camp, não é sobre fenômenos de estilo sinceros, é sobre moda e sua habilidade de se alimentar de tudo e cuspir plasticidade e transformar tudo em caricatura. e aí vai do jogo de cintura de cada stylist pra conseguir dar a volta na retórica e fazer dessa roupa menos plástica e forçada e mais, de fato, camp.


e aí vale tudo, de interpretação literal, a referências obscuras, a simplesmente aceitar que o espetáculo é que move nosso mundo atual e vale mais clique no instagram do que roupa que faz a gente pensar no tema.


de qualquer jeito, seguem abaixo meus visus preferidos da noite, acompanhados de trechos do texto original de susan sontag que, a meu ver, representam bem a escolha das roupas (basicamente as rôpa tudo que eu acho que tão dentro do tema e não são apenas egotrip louca de celebridade)


Camp is a certain mode of aestheticism. It is one way of seeing the world as an aesthetic phenomenon. That way, the way of Camp, is not in terms of beauty, but in terms of the degree of artifice, of stylization.


Camp is a woman walking around in a dress made of three million feathers.


The old-style dandy hated vulgarity. The new-style dandy, the lover of Camp, appreciates vulgarity. Where the dandy would be continually offended or bored, the connoisseur of Camp is continually amused, delighted. The dandy held a perfumed handkerchief to his nostrils and was liable to swoon; the connoisseur of Camp sniffs the stink and prides himself on his strong nerves.


Aristocracy is a position vis-à-vis culture (as well as vis-à-vis power), and the history of Camp taste is part of the history of snob taste. But since no authentic aristocrats in the old sense exist today to sponsor special tastes, who is the bearer of this taste? Answer: an improvised self-elected class, mainly homosexuals, who constitute themselves as aristocrats of taste.


Camp sees everything in quotation marks. It's not a lamp, but a "lamp"; not a woman, but a "woman." To perceive Camp in objects and persons is to understand Being-as-Playing-a-Role. It is the farthest extension, in sensibility, of the metaphor of life as theater.


Still, the soundest starting point seems to be the late 17th and early 18th century, because of that period's extraordinary feeling for artifice, for surface, for symmetry; its taste for the picturesque and the thrilling


The most refined form of sexual attractiveness (as well as the most refined form of sexual pleasure) consists in going against the grain of one's sex. What is most beautiful in virile men is something feminine; what is most beautiful in feminine women is something masculine. . . . Allied to the Camp taste for the androgynous is something that seems quite different but isn't: a relish for the exaggeration of sexual characteristics and personality mannerisms


Camp taste nourishes itself on the love that has gone into certain objects and personal styles.


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