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  • Foto do escritormelody erlea

roupa é texto: analisando billie eilish


eu adoro a billie eilish. é muito raro eu topar surfar no hype do momento, mas a billie manda bem demais - ela faz música pop com qualidade e originalidade, cheia de referências, com bom humor, ironia, sensualidade e um pouquinho de militância.


o estilo dela já foi destrinchado muitas e muitas vezes desde sua explosão pra fama e continua sendo único num mundo pop que vive de nos vender tendências. billie tem um visu-assinatura, um uniforme praticamente, que funciona como uma tela em branco pra que ela crie a arte que quiser - de abuso de logomarcas de grife a roupas customizadas à mão por ela mesma, passado por óculos de camelô, tinta no cabelo do tipo eu-mesma-fiz e uma coleção de tênis de cair o cu da bunda.


eu não sou de comentar visu de tapete vermelho, mas foi impossível pra mim não notar um teco de handmaid's tale nesse visu burberry que billie usou para o american music awards ontem: esse chapéu branco me remete imediatamente às asas que a handmaids precisam usar por cima da touca quando em público. a rede cobrindo o rosto podia perfeitamente ser um acessório adicional do uniforme das handmaids, que são instruídas sempre a demonstrar modéstia e evitar contato visual.


o chapéu de billie tá coberto por cristais, o que adiciona ainda mais uma camada de interpretação do visu: ao mesmo tempo que temos a modéstia do rosto escondido e das roupas largas, o xadrez da burberry e os cristais são símbolos de luxo, de ostentação e de poder financeiro - ironizados justamente pela modelagem da roupa e da pouca exposição do corpo feminino.

a mensagem aí pode ser interpretada de mil maneiras, que vão depender das referências de quem tá olhando pra roupa - pra mim, é um grande foda-se ao ideal de mulher perpetuado pelas grandes marcas de luxo, um sinal pra que se desconstruam esses ideais da maneira que quisermos, um exemplo de como a moda pertence a quem a veste, e não a quem a comercializa, e uma prova de que é possível sucesso feminino sem que haja exploração da sexualidade e objetificação. 

a amazônia tá pegando fogo, a austrália tá pegando fogo, a california tá, sempre, pegando fogo e a billie eilish se apresentou no @amas no domingo com uma camisetona que dizia NO MUSIC ON A DEAD PLANET (não há música num planeta morto) e tinha labaredas de fogo estampadas em paetê. a música que ela cantou, all good girls go to hell, é justamente sobre aquecimento global e o extermínio da humanidade. gente que veste suas referências: meu tipo de gente (mas espero que alguém tenha avisado a billie que paetê não é sustentável - ou tomara que seja paetê biodegradável, já existe isso?)

mas a referência que eu mais amo ver a billie eilish vestir é a referência que eu mais amo vestir: desenho animado. acho maravilhoso celebridade que não se apega a referências amplamente aceitas no mundo adulto, acho incrível gente que não renega a criança interior e seu papel na formação do nosso eu adulto, acho magnífico famoso que sai do senso-comum das referências e da estética vigente, acho lindo quem consegue se levar pouco a sério.


e num mercado de música que explora a sexualidade de adolescentes talentosas e as vende com um sex-appeal de mulher mais velha, quão original é ver uma cantora que exibe a coisa mais infantil de todas: desenho animado véio.


é tipo: eu não vou apenas me recusar a ser objetificada e sexualizada, eu vou puxar a balança pro lado oposto e vou me infantilizar e des-sexualizar por completo.


mas aí a gente ouve as letra e pensa: pohan, billie, de criança você não tem nada. e o objetivo é todo esse: que a gente se desapegue da falsa maturidade sexual de jovens cantoras e se apegue à maturidade da mensagem , da música, da visão. e billie enxerga, gente, pra muito além da tv ligada nas meninas superpoderosas.

pohan, e tem gente que não gosta de moda E NEM de música pop atual. cês me desculpem mas isso é preguiça de enxergar e ouvir com atenção.


EXTRA:

¯\_(ツ)_/¯


o jeito que a gente interpreta mensagens visuais depende demais das nossas próprias referências culturais. foi a @bia_dantasc que cantou essa bola pra mim: olha como o visu da billie eilish lembra o chaves, gente???? a paleta de cores, o modelo do boné; uma vez visto não dá pra desver! quem diria que o chaves taria lançando moda em tapete vermelho gringo, hein?

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